Bioenergia e Agroquímicos
O desenvolvimento sustentável apresenta como aspecto marcante a utilização do conhecimento científico para gerar inovações tecnológicas que auxiliam na melhoria das condições de vida dos seres humanos. O foco das pesquisas nesse segmento visa à geração de energia limpa a partir de fontes renováveis.
A relação direta entre a utilização intensiva de combustíveis fósseis, a liberação de gases de efeito estufa e as alterações climáticas do planeta apontam a necessidade de fontes de energia renováveis e tecnologias de baixa emissão de carbono. Nesse contexto, a agroenergia apresenta-se promissora para a produção de energia limpa a partir de produtos derivados da biomassa.
Nos últimos anos, o setor agroenergético apresentou grande expansão, e representa atualmente o grande fator de sustentabilidade da matriz energética nacional, correspondendo a 30% da oferta interna de energia. O destaque do Brasil na produção de biocombustíveis líquidos aponta o desenvolvimento desse setor como estratégico para atender ao aumento da demanda por combustíveis provenientes de fontes renováveis.
A utilização de agroquímicos é essencial para o controle dos fatores envolvidos na produção agrícola, tornando possível o aumento da produtividade e o atendimento à demanda por produtos alimentícios, fibras e recursos energéticos provenientes de fontes renováveis. Nos últimos anos a preocupação com os impactos ambientais causados pela utilização desses produtos tem aumentado, de forma que aliar o atendimento das necessidades da população mundial à preservação dos recursos ambientais é um dos grandes desafios do desenvolvimento sustentável. Nesse contexto, o processo de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) de novos agroquímicos torna-se fundamental, uma vez que a descoberta de compostos bioativos, mais eficazes e seguros, pode proporcionar o aumento da produção e a redução da área necessária para cultivo, bem como diminuir os recursos hídricos e energéticos empregados.
Cana-de-açúcar
A cana-de-açúcar destaca-se como uma das principais fontes de energia renovável, constituindo a principal matéria-prima na busca por energia limpa e sustentável. Diante da relevância econômica do setor sucroalcooleiro para a economia nacional, fatores capazes de comprometer o rendimento produtivo devem ser rigorosamente controlados, com o objetivo de garantir o crescimento da produção e atender ao cenário de expansão projetado para as próximas décadas.
O cultivo e produção de derivados da cana-de-açúcar são influenciados por diversos fatores, dentre eles, destacam-se as fitopatologias causadas por bactérias, fungos e vírus. Atualmente, já foram identificadas mais de duzentas doenças que atingem a cana-de-açúcar, algumas causando danos substanciais à cultura. Entre elas, cinco são consideradas as mais importantes: i. carvão; ii. ferrugem; iii. raquitismo das soqueiras; iv. mosaico; e v. escaldadura das folhas, sendo esta última o foco de pesquisa do nosso grupo de pesquisa.
Escaldadura das Folhas
A escaldadura das folhas é causada pela bactéria Xanthomonas albilineans (Ashby) Dowson, sendo encontrada distribuída em praticamente todas as regiões do mundo onde a cana-de-açúcar é cultivada. A doença causa diminuição da produtividade, necessidade de reforma precoce dos canaviais e queda de qualidade do caldo extraído que determinam prejuízos econômicos significativos para os agricultores.
Alvos Moleculares para o Desenvolvimento de Novos Agroquímicos para a Escaldadura das Folhas
Na cana-de-açúcar, as fitotoxinas albicidinas desempenham função importante na patogenicidade e disseminação sistêmica da X. albilineans. A inibição da replicação de DNA pelas albicidinas impede o desenvolvimento dos cloroplastos, levando ao aparecimento dos sintomas característicos da escaldadura das folhas.
PPT de X. albilineans
A biossíntese de albicidina inclui vários genes importantes que se encontram reunidos em posições específicas no genoma de X. albilineans, entre eles destaca-se os genes que codificam para a enzima fosfopanteteína transferase (PPT), responsável pela transferência do grupo fosfopanteteína da coenzima A para um resíduo de serina conservada nas proteínas PKS e NRPS e benzoato-CoA ligase (BCL) responsável pela formação de ligações carbono-enxofre.
BCL de X. albilineans
FolD de X. albilineans
Os folatos participam da interconversão entre serina e glicina e do catabolismo de histidina. Além disso, são componentes essenciais para a síntese de purinas, pirimidinas e metionina, logo, essas biomoléculas desempenham função central nas vias metabólicas responsáveis pela sobrevivência celular. Enzimas envolvidas na síntese e modificação do tetraidrofolato (THF) são responsáveis pela manutenção dos níveis celulares adequados deste cofator, exercendo função extremamente importante na sobrevivência bacteriana. Entre as enzimas desta via, merece destaque a N5,N10−metilenetetrahidrofolato desidrogenase – ciclohidrolase (FolD), que catalisa a produção de N10−formil−THF a partir do N5,N10−metileno−THF. O gene codificante para enzima FolD é essencial para a biossíntese de folatos em bactérias Gram-positivas e Gram-negativas.
Cacau
Vassoura-de-Bruxa
O agente causador da Vassoura-de-Bruxa é o fungo basidiomiceto Moniliophthora perniciosa. No Brasil, o cacau está presente na sua região de origem, bacia do rio Amazonas, mas só passou a ser um produto de grande importância econômica após sua introdução no estado da Bahia, em 1746. Na década dos anos 1970 a cacauicultura foi uma das fontes de divisas mais importante do Brasil, atingindo uma produção de 405 kilotoneladas de sementes de cacau em 1986. A produção era concentrada no sul da Bahia, principalmente por ser essa uma região livre de Vassoura-de-Bruxa a qual foi sempre foi considerada um limitador de produção para o cacau na Amazônia. Em 1989, iniciou-se uma epidemia da doença Vassoura-de-Bruxa nesta região que deixou a produção nacional com menos de 130 kton em 1998, inferior à necessidade da indústria de 250.000 ton/ano. A doença é um dos problemas fitopatológicos mais importantes a atingir o hemisfério sul nas últimas décadas. Hoje a Vassoura-de-Bruxa está em todos os países produtores de cacau da América Central e do Sul.
Alvos Moleculares para o Desenvolvimento de Novos Agroquímicos para a Vassoura-de-Bruxa
Os patógenos possuem biomoléculas, denominadas efetores, capazes de manipular estruturas e funções celulares do hospedeiro, facilitando o processo de infecção e/ou incitando respostas de defesa. Proteínas deste tipo são descritas como tendo funções cruciais nas interações patógeno-planta, especialmente em fungos.
A proteína NEP1 foi identificada e descrita como uma nova classe de elicitores. Na última década, inúmeras proteínas foram incluídas nesta família, agora denominada NLPs (NEP1-like Proteins), pertencentes à diversos grupos de microrganismos, como bactérias, fungos e oomicetos. No genoma de M. perniciosa foram encontradas três cópias pertencentes às NLPs chamadas de MpNEP1, MpNEP2 e MpNEP3. Membros da família NLP funcionam como ativadores do sistema de defesa das plantas, estando envolvidos na síntese de fitoalexina e etileno, indução de proteínas relacionadas à patogenicidade, formação de necrose no local de infecção e a morte celular. Estudos funcionais das NEP1 e NEP2 de M. perniciosa indicaram que ambas são capazes de induzir necrose e emissão de etileno em folhas de cacau.
NEP2 de M. perniciosa